“Para quem quer fazer exercícios de reflexão”

Olá crianças!

Analogias e metáforas são excelentes para que possamos conhecer o que essencialmente é determinado fenômeno. Principalmente para aqueles que, de tão óbvios, fazem parecer que nenhum vocabulário de qualquer língua é capaz de descrever em sua plenitude. Não farei algo muito diferente hoje, mesmo que seja para falar de algo que já comentei aqui a respeito: os remakes.

Ouvi no rádio esta semana sobre uma banda cover do Led Zeppelin que tocaria em algum lguar aqui de São Paulo e constatei algo meio óbvio para mim: não gosto muito de bandas covers. Então, fiquei me perguntando porque não. Simplesmente pensei: “por que não é a mesma coisa”. O curioso é que bandas covers querem, de fato, não ser nada diferentes de seus ídolos: não só querem tocar suas músicas, mas também que fique idêntico na sonoridade e no visual (além de um possível reconhecimento oficial pela banda original).

Então, alarguei um pouco essa reflexão e comparei bandas cover com pintores que se contentam em fazer reproduções de grandes pinturas. Por exemplo, artistas que copiam com maestria e perfeição obras de Da Vinci e qualquer outro que possam pensar. Evidentemente, isto poderia ser extrapolado para todas as artes plásticas de modo geral. E a literatura? Algo semelhante ocorre com aqueles que não leem os grandes mestres com prazer, mas emulam suas técnicas, trejeitos e chistes em cada frase e verso que redijam.

Ao voltar meu pensamento para os games, a primeira coisa que me veio como similar a este fenômeno foram os remakes. Em seguida os ports (ou conversões). Mas admito que não fiquei pensando demais nisso; vou ir refletindo conforme escrevo, enquanto espero suas ricas contribuições.

Parece-me um pouco estranho que eu seja um pouco desgostoso de bandas cover, pintores e escritores copistas, mas goste de remakes de games. Afinal, supostamente, seriam as mesmas coisas. Contudo, isto não é bem assim…

Lembram-se de que falei que os remakes são algo saudável? Ou seja, revisitar e “refazer” um jogo é algo interessante para novas e velhas gerações? Ou seja, utilizando novas (ou velhas) técnicas nós podemos aproveitar algo inteiramente novo. Nos exemplos que dei de bandas covers, eles não trazem nada de novo a não ser a simulação, a imitação de algo. Embora a imitação e a cópia possam se converter em um jogo divertido, não é isso que pensamos ao falarmos de remake.

Continuem tendo bandas cover em mente. Pensem agora também em grandes compositores de música clássica (ou barroca, tanto faz). É possível dizer que fazem “covers” das músicas antigas atualmente? Em muitos casos, isso até seria possível; muitas orquestras treinam seus músicos em instrumentos pouco ou nada utilizados hoje em dia para obter uma sonoridade mais próxima daquela explorada pelo compositor. Mas, de modo geral, o que ocorre é um “remake” (ou releitura) da peça musical, mesmo que o maestro seja cri-cri o suficiente para exigir total fidelidade ao que o compositor queria. Escutem, por exemplo, a cantata “Messias” de Haendel em diversas gravações diferentes; nenhuma delas soará igual à outra. De modo que nunca passa em nossa cabeça chamar tais execuções de covers, embora se baseiem nas mesmas pautas.

De maneira semelhante, vemos isso na música popular. Canções chatíssimas do Abba recebem versões épicas por grandes figuras do meio musical como Sixpence None the Richer, Avantasia e Rob Rock. Este último, grande cantor de heavy metal, gravou em seu disco chamado Holy Hell um cover de Move On; esta faixa, por sua vez, possui uma das mais belas poesias em inglês que já tive a oportunidade de ouvir e ler. E, devo dizer, a versão original do Abba é um assassinato aos meus tímpanos, enquanto que a versão do Rob Rock é como tomar um banho em um rio frio em um dia quente de verão. Ou seja, o remake, por não querer ser “fiel” ao original (seja lá o que essa expressão significa), conseguiu fazer mais justiça à letra, à melodia e a tudo mais que a música possui que a versão do Abba.

Por isso, não há nenhum conflito em não ser fã de imitações, mas gostar de revisitações genuínas que, em respeito pleno à obra original, não tenta copiá-la nos mínimos detalhes numa espécie de xerocópia. O respeito à tradição passa por este mesmo caminho; temos uma tradição de games? É possível que sim. Os jogos recentes respeitam essa tradição? Talvez alguns. E os remakes seriam uma honraria ou um desprezo pelo que veio antes? Depende.

Se os desenvolvedores se preocupam demais em ouvir os fãs mais antigos e copiar tudo nos mínimos detalhes, não estarão “fazendo algo de novo” (remake), mas “copiando algo”. Não estou dizendo que remakes devam ter “algo a mais” porque a questão aqui não é quantitativa. Imaginem se alguém resolvesse anunciar um remake do primeiro jogo de Mario para NES (como fizeram anos atrás). Suponham agora que ele se revelasse como uma mera cópia do original; não só os mais conservadores reclamariam, como também os mais novos. Contudo, na versão lançada para SNES, eles não acrescentaram nada de mais; a melhoria gráfica é a modificação mais notável. E, com isso, tornaram o jogo melhor. Poderiam, contudo, ter mudado muitas outras coisas se o desejassem; mas às vezes, somente um bigode no rosto da Monalisa já é suficiente para funcionar como um remake.

Capa do jogo Altered Beast para Playstation 2. Eu até que achei ele divertido; mas devo ser um dos únicos. 😛

Costumam criticar muito remakes de jogos por não serem fieis aos originais. Mas eu acho até bom que muitos remakes não o sejam. Às vezes estes mostram um respeito maior ao jogo original do que manter tudo do jeito que está. Exemplos? Nem é preciso ir muito longe. A série Sega Ages 2500 para Playstation 2 possui excelentes e péssimos remakes; além de outros da mesma empresa e lançados fora desta coleção como Altered Beast (que ganhou uma trama relacionada a experiências genéticas).

Claro que nem sempre o remake é melhor que o original, somente diferente. Por exemplo, a banda Symphony X tem um disco chamado “Paradise Lost” que é inspirado pelo grande poema épico de John Milton de mesmo nome (Paraíso Perdido em português). Este é de longe o disco mais completo da banda; meu preferido porque cada faixa tem uma coesão com todas as outras que é um tanto raro hoje em dia (ainda que suas melhores canções estejam dispersas em outros álbuns). Todavia, o poema que o originou é de uma graça, beleza e profundidade que o disco não conseguiu nem arranhar. Podemos chamar uma coleção de músicas de “remake” de uma poesia? Sem dúvida; embora seja difícil dizer o que veio antes (a poesia ou a música), podemos dizer que ambas são praticamente a mesma coisa: têm ritmo, graça e melodia. Algo semelhante pode acontecer com games: remakes bons em si mesmos podem nos levar a buscar aquele que o originou e, nele, descobrir algo que não esperávamos jamais. Como também podemos nos decepcionar com o original e louvarmos os méritos de seu remake.

Ilustração de Doré para o Paraíso Perdido de Milton. Vemos nesta Lúcifer sofrendo um pouco para sair do Inferno e encontrar Adão e Eva.

Muitas vezes não dizemos, ao vermos um filme ou game baseado em um livro, que “o livro é muito melhor”? Ou quando assistimos um filme ou lemos um livro baseados em um game não dizemos “o game é muito melhor”? Claro que há aí um juízo de valor, mas é importante ressaltar que às vezes o filme é melhor do que o livro, que o game é melhor que o livro e que o livro é melhor que o game em que se baseou. Quem sabe, um dia, isso não possa ser exemplificado com o mal falado Phantasy Star III? Talvez um remake “faça mais justiça” do que o original; desde que busque homenageá-lo e honrá-lo e não copiá-lo descaradamente.

É isso por hoje. Até o próximo post!

Academia Gamer: Cópias e remakes
Tags:                                                         

14 ideias sobre “Academia Gamer: Cópias e remakes

  • 22/02/2011 em 10:07 am
    Permalink

    Cópia e Remake, cadê?
    Ahhh, eu quero fotos de comparação, não gosto de ler >:(
    Mentira, assunto legal 😀
    Na questão de Livro melhor que Filme a única série que se encaixa é Percy Jackson e Os Olimpianos… Harry Potter e Senhor dos Anéis tem detalhes que confundem minha imaginação…
    “Assim podia-se ver o pequeninho gorro vermelho tamanho familia com coloração azul e tal pa”.
    Rick Riordan também faz isso mas, ele não foge a realidade…
    auheuaheuhauheu
    Té parece ¬¬

      [Citar este comentário]  [Responder a este comentário]

  • 22/02/2011 em 12:19 pm
    Permalink

    A questão dos remakes é sempre bastante polêmica entre nós, os velhões saudosistas dos games.

    Sou completamente a favor de remakes que de certa forma melhoram a jogabilidade do original, mesmo que isso signifique não ser fiel a ele. Afinal, de fiel, basta o original.

    No caso das músicas ou pinturas, as técnicas e instrumentos já estavam bem consolidados e desenvolvidos há muitos séculos atrás. Já os games ainda estão evoluindo tecnologicamente e conceitualmente. Isso significa que um jogo de Nes talvez não tenha sido feito exatamente como seu designer gostaria devido às limitações da época.

    Por isso apoio os remakes, por tentar trazer um releitura mais profunda do conceito originalmente proposto.

    Um exemplo de remake bem sucedido na minha opinião é a série Super Mario Advance para o GBA. Eles são praticamente conversões dos games na versão pro Snes, mas com recursos extras (saves, vozes, retoques gráficos) e metas adicionais. Eles melhoram a experiência de se jogar os games originais sem perder a identidade.

      [Citar este comentário]  [Responder a este comentário]

  • 22/02/2011 em 10:10 pm
    Permalink

    Um remake deve ter o equilibriio entre o seu original e a versão atual com suas próprias contribuições e inovações,porque só assim um Remake é justificável.
    Duas falhas recorrentes:
    1 remakes que não mudam substancialmente em nada,então porque fazê-lo…e
    2 remakes que são tão diferentes do original que é impossível traçar pontos em comum entre este e o original.
    Um bom remake é Donkey Kong Country Returns do WII,jogando eu reconheço caracteristicas do SNES nele mas ao mesmo tempo sei que não é a mesma coisa.Perfeito!
    Outro ponto em questão é em relação ao meio em que a arte é originalmente produzida.Como é possível comparar disco com livro? ou pintura com escultura ou cinema?Seria o mesmo que comparar kilograma com Ampere ou
    metros cubicos com campo magnético,são grandezas diferentes.Claro que no campo das artes é possível uma interdiciplinaridade com maior flexibilidade que na fisica não há ,por exemplo,mas mesmo assim eu sempre achei inútil comparar seriamente um livro com seu correspondente no cinema.Agora nos games é possível comparar jogos do passado com remakes atuais pois é game em relação a game,aí funfa! 🙂

      [Citar este comentário]  [Responder a este comentário]

  • 23/02/2011 em 12:22 pm
    Permalink

    @André Ricardo Voidelo
    huahuahaua Cara, estou tão enrolado aqui com uns problemas que eu até pensei em fazer algo como no outro post que falei de remakes (comaprando jogos antigos e suas revisitações). hehe Fica para uma próxima então.

    hehe Eu, particularmente, gosto mais do filme do Senhor dos Anéis que do livro. O Tolkien escreve com muitos detalhes (ou melhor: detalhes demais) e isso atrapalha um pouco o desenrolar da história. Tanto que preferi mil vezes “O Hobbit” do que a trilogia do “Senhor dos Anéis” mesmo.

    @Fernando Lorenzon
    Sem dúvida isto tudo que falou é importante. Nunca joguei esse Mario para G BA, mas pelo que falou fiquei interessado. Vou ver se encontro alguma coisa a respeito depois.

    A questão que fica é: os designes de duas décadas atrás gostariam de fazer algo melhor do que podiam naquela época, ou simplesmente pensavam em um game de acordo com aquilo que podiam fazer? Me refiro aqui mais a gráficos, músicas etc. Esquemas de jogabilidade e coisas assim independem da tecnologia disponível.

    Uma entrevista com um designer das antigas poderia render algumas respostas neste sentido.

    @Daniel Paes Cuter
    hehe Pior que poderia mesmo ser uma boa.

    @Dactar
    Os dois pontos que falou são realmente recorrentes. O que é uma pena em muitos casos.

    No caso de livros e discos comparados entre si, acho que seja possóvel em alguns casos. Por exemplo, se houver algo comum que os una. Senhor dos Anéis é uma história que tem uma versão original em literatura e outra em película; cabe comparar? Por que não? Symphony X tem um álbum inspirado por Paraíso Perdido do Milton; podemos comparar? Sim.

    Mas não vejo a comparação como algo semelhante a pesar e ver qual é melhor. É reconhecer suas diferenças e peculiaridades, nada mais do que isso.

    E comparar futebol “de verdade” com futebol de botão e pebolim? Os três são jogos, não são? 😀 Só para ampliar um pouco a reflexão (e queimar alguns de meus próprios neurônios no processo).

      [Citar este comentário]  [Responder a este comentário]

  • 23/02/2011 em 6:33 pm
    Permalink

    Fernando Lorenzon :
    Um exemplo de remake bem sucedido na minha opinião é a série Super Mario Advance para o GBA. Eles são praticamente conversões dos games na versão pro Snes, mas com recursos extras (saves, vozes, retoques gráficos) e metas adicionais. Eles melhoram a experiência de se jogar os games originais sem perder a identidade.

    Acho que quando vai nesse caminho, não tem problema nenhum. Remakes que deturpam completamente o game original me incomodam. Se for pra mudar tudo, que use outro nome.
    E quanto ao que o Senil disse sobre covers, pra criar um paralelo nos games, penso que o “cover”, seriam os jogos em emuladores, que “imitam” o original. Esses games “remake” estão mais pra “versões”, aí sim se encaixando no exemplo da música do Abba.

      [Citar este comentário]  [Responder a este comentário]

  • 23/02/2011 em 11:10 pm
    Permalink

    Talvez seja até infantilidade ou descaso linguístico pensar assim, mas sou desses que busca definições imaginárias nas palavras:

    cover: proteção, cobertura, aquele que almeja tomar a dianteira (e, por consequência, o original)
    cópia: mera reprodução tal qual a original.
    remake: re-feito, ou seja, houve esmero e dedicação para o processo de reprodução.

    São só devaneios, viva o neoísmo!

      [Citar este comentário]  [Responder a este comentário]

  • 25/02/2011 em 11:37 am
    Permalink

    Questão interessante, ótimo post e, obviamente, gostei das analogias musicais. =P

    Eu gosto de remakes por outra questão: consoles. Muitas pessoas vendem os consoles antigos, ou eles param de funcionar. Tem os emuladores, claro, mas eu prefiro jogar em um console atual.

    Quanto às diferenças… Não acho que tenha que ser 100% fiel ao original, mas tem mudanças de que não gosto. Odiei o que fizeram com a Maria na versão pra psp do Castlevania Symphony of the Night, por exemplo.

      [Citar este comentário]  [Responder a este comentário]

  • 25/02/2011 em 3:34 pm
    Permalink

    @Iceman
    Sim, sem dúvida pensava em emuladores e em relançamentos de jogos idênticos em sistemas mais recentes (Virtual Console, por exemplo). Mas não só; tem alguns remakes que, de tão iguais aos originais, passam essa mesma impressão de que queriam “emular” aquele em que se baseou.

    @Dactar
    Ah, isso com certeza.

    @Aglio
    hehehe Eu gosto disso! Não chega nem a ser uma busca de definições imaginárias. Você tnta desvelar o sentido das palavras de utras formas. Por exemplo, pensou “cover” como a tradução deste termo como “cobertura” que, inclusive, tem a ver com “capa” que nem sempre faz justiça ao que “esconde”. Será que bandas covers não seriam aquelas que qeurem ser como uma capa de um livro? Emular (ou imitar) aquilo que todos tem fácil acesso ao verem e ouvirem certo grupo musical? hehehe

    Eu próprio entendo o remake como um “re-fazer” também. Principalmente naqueles casos em que realmente fizeram tudo de novo, desde o zero, como se fosse algo completamente diferente.

    @Patty K
    hehe Pode esperar ainda mais analogias musicais. Assim como adoro literatura, também sou apaixonado por música (de variados estilos e épocas). Uma hora ou outra isso vai acabar aparecendo; sai até sem querer às vezes.

    Isso é bem comum mesmo. O acesso fácil em consoles mais modernos a jogos antigos é realmente muito interessante. Embora alguns jogos sejam impraticáveis com alguns controles. Por exemplo, alguns games de Saturn são impraticáveis com o joystick do PS2.

    Ah, nós sempre nos prendemos a algum detalhe do jogo que muitas outras pessoas não se ligaram. Por exemplo, você gostou da Maria do jogo original do jeitinho que ela era; mas os novos designers (ou os jogadores que podem ter entrevistado durante o processo) não deram a ela o mesmo valor que você, então optaram por mudar sem se preocupar muito. Isso acontece muito; e às vezes é somente isso que muda.

      [Citar este comentário]  [Responder a este comentário]

  • 27/02/2011 em 12:57 pm
    Permalink

    existem vários remakes que são melhores que o original, vários filmes que são melhores que o livro, e vários covers que são melhores que a música original

    arte é acima de tudo diálogo, e é este diálogo com diferentes referenciais, culturas e épocas o que garante a permanencia de uma obra na história.

      [Citar este comentário]  [Responder a este comentário]

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.