“Para quem quer fazer exercícios de reflexão”

Olá crianças!

Antes de tudo, uma explicaçãozinha merece ser feita. Quando falo de “jogos representativos”, não tenho em mente aqueles jogos “mais representativos”, por exemplo, de determinadas épocas e estilos. Penso, simplesmente em jogos que têm como tarefa principal a representação. Mas isso vai ficar mais claro (espero) durante o restante do post.

Venho falando aqui repetidas vezes que o jogo é um “mundo fechado” dentro deste mundo em que vivemos (no qual nascemos e do qual haveremos de sair com nossa morte pessoal). Contudo, existem alguns jogos em que uma dessas paredes vedadas cai. Isso porque alguns jogos possuem como tarefa a própria representação e como representar é sempre representar para alguém, possui algumas peculiaridades em relação a outros. Ou seja, de modo geral os jogos não são representados para alguém. E isso mesmo em casos de esportes ou eventos do tipo em que há pessoas assistindo: se aqueles em campo se preocupassem demais com os espectadores, deixaria de ser jogo.

Essencialmente, jogar é atravessar uma porta e fechá-la atrás de nós.

De qualquer forma, em tais jogos representativos há a figura sempre presente de um espectador. Um exemplo mais claro disso é o teatro. Nestes casos, é somente através do espectador que tais jogos ganham seu inteiro significado. Ou seja, não são exclusivamente os atores que lhe dão sentido porque os jogos representativos são o conjunto de atores e espectadores; embora sejam os espectadores que o experimentem mais propriamente.

Isso pode parecer certo preconceito, mas na realidade, os atores não são totalmente absorvidos pelo jogo representativo do qual fazem parte. Mas por uma razão simples e compreensível: suas ações naquele jogo sempre acontecem tendo como objetivo o conjunto do espetáculo e a fascinação que devem exercer sobre cada membro da plateia. Isso significa que, em jogos representativos, quem deve ser absorvido é o espectador e não o ator. O que não desmerece, claro, o trabalho deste. O fato é que o jogo representativo é jogado e sentido como jogo muito mais na figura do espectador.

Estes assistindo o jogo também estão jogando à sua própria maneira.

 

E como isso pode se aplicar a games, vocês se perguntam.

Uma coisa que sempre foi clara para mim é que games são jogos. E, portanto, ao mesmo tempo que todo game possui as características essenciais ao jogo em geral, alguns deles podem ser especificados um pouco mais. E “games representativos” seriam uma possibilidade viável.

Nós, fãs de jogos antigos, conhecemos bem um certo número de jogos e sabemos que muitos deles só “nos mostram coisas na tela”. Ou seja, nosso papel ativo ali é mínimo. É como se realmente fôssemos unicamente espectadores e não “jogadores” (no sentido de “atores” ao lembrarmos do exemplo do teatro que utilizei). Mas mesmo quando criticamos tais jogos, nos lembramos de outros semelhantes que nos envolveram magicamente como outros jogos mais “ativos” por assim dizer.

O famoso (e polêmico) Disco 2 de Xenogears.

Ao jogarmos algo assim também estamos lá em jogo. Um game que talvez sirva como exemplo por comportar ambas as modalidades de jogo em um único título seja o Xenogears para PSX. O segundo CD deste game é famoso pelo fato de somente lermos textos imensos e assistirmos diversas cenas que explicam e mostram o que foi acontecendo após os eventos do primeiro disco com pouca participação ativa nossa. De vez em quando controlávamos alguma coisa (ou uma batalha contra chefes, ou um labirinto de duas salas somente, ou para salvar depois de quarenta minutos de texto).

Talvez então pudéssemos dizer que neste segundo CD, experimentamos um “game representativo”. E talvez até mesmo no primeiro se pensarmos que o objetivo principal do jogo seria “mostrar uma bela estória aos ‘jogadores'”. Coloco entre aspas porque, neste caso, se a tarefa que o jogo nos coloca é “sente e assista o que acontece, mexendo nos botões de vez em quando”, somos muito mais espectadores do que “atores” neste jogo representativo.

Outro exemplo de um jogo (e provavelmente uma série) que quer mostrar muito e cujos jogadores tendem a ser espectadores.

E este é um dos males dos jogos atuais (embora não seja exclusivo de títulos recentes, evidentemente). A preocupação em “contar uma boa estória” é tamanha que praticamente todo game que sai é representativo e exige que seus apreciadores sejam todos espectadores. Um outro problema decorrente diretamente desse é aquele que nos leva a considerar games unicamente como um “meio de comunicação” e, em outro momento, como “arte”. O jogo da arte é representativo e comunicativo, mas nem todo game é (ou deveria ser) representativo e, certamente, não deveria buscar ser arte.

Claro que tentam “consertar” esse problema dizendo que buscaram criar um jogo “mais interativo” e que este seria um perfeito exemplo de “arte interativa”. O que esquecem é que toda arte é por natureza comunicativa e interativa por ser jogo; mas que nem todo jogo é representativo e exige um espectador. Bater a bola na parede sem deixá-la cair no chão pode ser jogo, mesmo sem ser representativo; um filme deixa de ser jogo quando deixa de ser representativo. Na verdade, tal filme assim sequer pode existir porque os jogos representativos em geral partem do suposto de alguém que observa através da parede caída.

Um exemplo de jogo interessante para pensarmos. Time Gal segue na esteira de jogos como Dragon’s Lair. Seria um jogo representativo por ser baseado em vídeos previamentge gravados, ou não?

Para concluir: em geral games não nos mostram coisas simplesmente. Alguns deles o fazem certamente, mas nem todo game é representativo, pois nem sempre somos meros espectadores de uma estória, de um texto, de um Full Motion Video.

É isso que queria compartilhar hoje com vocês! Até o próximo post!

Academia Gamer: Jogos representativos
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10 ideias sobre “Academia Gamer: Jogos representativos

  • 25/10/2011 em 8:37 am
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    Sr. Senil

    Tem um colega meu que fala que o termo RPG ou Role PLaying Game utilizados nos jogos do gênero não está certo.
    Porque você só comete ações pré determinadas. o jogo se desenvolve por si.

    Enfim, eu penso que são jogos bacanas, rotular os games é complicado.

    Um jogo bem representativo é esse Time Gal, joguei tanto isso, inclusive tenho ele aqui.

    Os RPG’s perderam um pouco a essência deles de jogos demorados, que faziam a gente ficar horas na tela da TV.

    Outro jogo que poderia pensar que eles são representativos seria Vib Ribbon, Parrapa The Rapper, Klonoa, Astal entre outros.

    Enfim é isso e abraço.

    Ulisses Old Gamer 78

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  • 25/10/2011 em 8:57 am
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    Snatcher!

    eu baixei esse jogo domingo passado no SATURN(em japonês) e é um claro exemplo disso que você mencionou. eu não o joguei muito, o máximo de ação que tive foi na parte onde Gillian Seed vai praticar tiro ao alvo. e o resto foi uma looonga conversa com o chefe dos JUNKERS(ainda por cima em japonês) e fui apresentado ao robozinho metal gear. eu pelo menos gostei,mesmo não tendo muita ação. só que tenho vários games na frente, Snatcher vai ter que esperar…

    outro jogo incrível que gostaria de jogar desse gênero é o Radical Dreamers, o “verdadeiro” sucessor de Chrono Trigger. fiquei com vontade de conhecer esse jogo, quando eu e emu irmão zeramos o Chrono Cross e vimos o final….pelo o que eu vi do desfecho, o game merecia ou indicava uma continuação e não lançaram até hoje. o jogo pelo que pude pesquisar, é quase se o jogador jogasse um livro, pois aparece mais imagens do que ação, até mesmo na hora das lutas o jogo é paradão. mas fiquei seco para zera-lo.

    jogos de representação seria o excelente Out of This World e o apavorante/traumático Clock Tower que estou zerando aqui.

    HEE-HOO, Mestre Senil.

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  • 25/10/2011 em 10:51 am
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    Me identifiquei bastante com essa parte:
    “E este é um dos males dos jogos atuais (embora não seja exclusivo de títulos recentes, evidentemente). A preocupação em “contar uma boa estória” é tamanha que praticamente todo game que sai é representativo e exige que seus apreciadores sejam todos espectadores.”
    Não sei quanto a maioria, mas eu já não tenho saco de sair de um jogo que me conta uma história(e dão uma jogabilidade ilusória) e partir pra outro e mais história, no geral a jogabilidade não me satisfaz como jogador. Exemplos seriam jogar um Final Fantasy(Malhação), aquilo ali é basicamente história, as lutas são meramente ilustrativas, e nessa limitação eu gosto mesmo é de curtir estar jogando o jogo, sinto isso nos tactics mas não nos jogos comuns dessa série.
    Passo horas jogando um F1 2011 ou um Fifa12, até mesmo jogo uma vez por dia que seja o Street Fighter 2, pareço repetitivo mas nesses jogos não estou nem aí pra história, o que me diverte é jogar e nesses eu jogo. Fico com receio de entrar nesses jogos que contam história, e a falta de originalidade fazer eu perder meu tempo, quando podia realmente estar jogando.

    Grande post Senil, com o tempo poderá juntar todos em um só e fazer um livro.

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  • 25/10/2011 em 6:09 pm
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    Acho que existe um certo exagero, do tipo ódio, aos jogos Jrpgs, por focarem bastante na história(e dramalhão). De certa forma gosta da história, e ela que geralmente me faz ir em frente em certos jogos. E claro que a jogabilidade sempre conta, e tem jogos que pouco me importa a história.
    O importante é encontrar algo que gosta, ao invés de ficar odiando tudo e arrumando brigas por ai.

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  • 26/10/2011 em 12:15 am
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    Não adianta, Senil. Você não vai me convencer de gostar de jRPGs. hehe

    Até nem ligo tanto quando o jogo conta bastante história. Já ocorreu de me identificar com personagens de RPG e curtir o desenrolar da trama.

    Porém, preciso que haja algum elemento que me desafie como jogo. Um exemplo de RPG que joguei exaustivamente até terminar 2 vezes (1 vez para cada protagonista) foi o Super Robot Taisen: Original Generation, que se trata de um RPG tático dos bons, além de fugir do tema medieval batido e utilizar uma temática futurista de robôs gigantes (ok, também é batido). O lado tático é estimulante o suficiente para que eu goste do jogo.

    PS. Senil, caso um dia acabe seu assunto para a Academia, não se acanhe de parar momentaneamente os posts. Gostaria de ler resenhas de games feitas por você, e um intervalo do Academia no futuro poderia ser o momento ideal para escrevê-las.

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  • 26/10/2011 em 1:13 pm
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    O problema dos RPGs – se é que podemos chamar de problema – não é nem a representatividade exagerada que vemos invariavelmente, o pior é a linearidade em que a narrativa ocorre. Alguns jogos praticamente “te levam pela mão” e você percebe como você tem poucas escolhas. O tão criticado Final Fantasy 1, por exemplo, não sofria deste mal. Claro, havia uma evolução natural que impedia que você acessasse uma certa região, mas, a priori, você podia ir para onde quisesse, quando quisesse. Acho que por isso eu gosto tanto do Ultima IV. Nele, você faz o storyline e, enquanto progride, tens que fazer um monte de coisa que te deixam ocupado – ou entretido – o suficiente para entrar de cabeça no mundo do jogo.

    Só que hoje esse “mal” não se restringe somente aos RPGs. Gosto muito de Metal Gear e fui conferir um longplay do 4 na internet. Poxa, até o jogador ter a primeira ação no jogo acho que foi uns 40 minutos de vídeo explicando a estória. Depois da (pouca) ação, veio mais uns 20 minutos de blá blá blá. Isso não desmerece o jogo de forma alguma, só que se o jogador pretende apenas relaxar o efeito vai ser o contrário. Melhor é pegar um Street Fighter ou um jogo de esporte para ter um pouco de ação imediata. Aliás, acho que se um game quer ter uma estória complexa e profunda, deviam fazer como os jogos antigos, criando um manual com mais de 200 páginas. O jogo vai ser mais fluído e a estória bacana sendo que o jogador tem a opção de ficar ou não por dentro. Eu adoro os manuais antigos por causa disso, é divertido ler e não prejudica a jogatina.

    É isso. E concordo com o Juliano. Um dia o Senil deveria juntar esses temas todos e fazer um livro, ia ser bem legal.

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  • 29/10/2011 em 12:12 pm
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    @Ulisses Old Gamer 78
    Essa é uma reflexão interessante, principalmente se pensarmos em RPGs de mesa. O primeiro RPG (D&D) é derivado diretamente dos wargames e, por essa razão, o foco era nos combates mesmo. E, nessa série, sempre foi. Um pouco menos na terceira edição talvez, mas na quarta isso voltou com muito mais força. De modo que nem é um jogo representativo: o foco não está muito na tarefa de representar, mas de escolher bem o que fazer nos combates e tal. Em outros sistemas, o foco é mais na representação, mas a reflexão ainda vale: seriam eles representativos? Afinal, quem joga Live Action está pouco preocpuado com aqueles que observam o jogo se desenrolando.

    Um problema dos RPGs hoje em dia, na minha opinião, é que eles se tornaram mais demorados. Não porque apreciamos nos demorar neles, mas porque eles são absurdamente compridos mesmo. Se Phantasy Star I você termina (sabendo tudo que tem para fazer e sem pressa) em umas dez horas, um outro qualquer leva no mínimo cinquenta. E chega a ser marketing algo como “cinquenta horas de pura diversão”. Beira o monótono muitas vezes…

    @leandro(leon belmont) alves
    Snatcher é muito bom mesmo e praticamente todo jogo do Kojima é representativo. Afinal, a área dele é o cinema e ele se preocupa em “mostrar algo” para o jogador-espectador mesmo. Eu até fiz uma resenha desse jogo por aqui há algum tempo e também de Policenauts (que acho superior inclusive – é o melhor jogo do Kojima na minha opinião).

    O Radical Dreamers segue esse esquema mesmo. Ele é divertido e descreve um dos vários mundos alternativos de Chrono Cross. É um “text adventure” semelhante a muitos outros em que você lê texto, faz algumas opções, anda através de algumas salas, adquire itens, usa itens e por aí vai. Eu gosto das músicas dele também para ser sincero.

    @helisonbsb
    hehehehe E a gente que fica só olhando sem fazer nada só complementa todo o contexto desse jogo! huahauhauhauha

    @Juliano
    Penso exatamente a mesma coisa. O problema dos games representativos não é ter o foco na história, mas tornar todo o restante pura enrolação. Snatcher (aproveitando o exemplo do Leandro) é um bom exemplo disso: a história é boa, mas não tentam “enganar” dizendo que é muito mais do que isso.

    E Final Fantasy (concordando novamente) é mais ou menos isso que descreveu. Principalmente a partir de Final Fantasy IV. Embora o Final Fantasy V tenha dado uma “pausa” nesse esquema (já que o enredo é bem simples e o foco está realmente em outras coisas – como o sistema de profissões); tanto que não é a toa que FFV é o meu predileto da série toda (contando até o FFIX – não joguei a partir do FFX).

    Nem sempre o enredo/estória precisa ser o principal em um game. Graças a Deus aliás que muitos designers pensam assim. Street Fighter II é um bom exemplo (embora eu não jogue há muitos e muitos anos), mas muitos outros se enquadram nisso também. Tanto que, quando tinha mais tempo, jogava um RPG básico e, “para descansar” dele, jogava algo mais simples como plataforma e tal.

    hehe Valeu cara! Eu tenho planos mesmo de fazer um livro para dizer a verdade. O grande problema seria encontrar alguém para ilustrá-lo antes e, claro, arranjar uma editora que o publicasse. Meu plano é esperar até o post 100 e começar a redigir algo mais concreto (inclusive com os comentários de vocês – afinal, só meus posts seria algo muito sem graça e irreal. Aprendo muito com vocês através das suas mensagens).

    @Guilherme
    Sem dúvida. Não vejo nada de mal no fato do foco ser o enredo! Em muitos jogos, ela é o aspecto principal mesmo; e tem que ser assim. O problema principal seria considerar que esse seria um elemento que aparece em todo jogo (em graus menores e maiores) quando, na realidade, nem sempre é assim.

    @TRB_MetroidTeam
    Com certeza! hehehehehe Eu caminho mais para outros jogos de luta, mas concordo plenamente!

    @Fernando Lorenzon
    huahauhauhauhauha

    A questão do desafio é importante mesmo. Quando o foco é o enredo, isso acaba aparecendo de alguma outra forma (como quando lemos um livro, por exemplo).

    Está ficando repetitivo, é? Eu realmente queria ter tempo para escrever algumas outras resenhas… Tenho vários esboços aqui de algumas séries especiais que planejo há vários meses (em um caso específico, mais de um ano já), mas não encontro tempo para conclui-las. Além de resenhas de jogos bem pontuais e específicos.

    @Onyas
    Essa linearidade nem me incomoda muito para ser sincero. Eu até prefiro em comparação com algo muito aberto como Ultima. Sei lá, fico meio perdido tendo que arrumar coisa para fazer ao invés de saber qual a tarefa do jogo. hehehe Por isso até que mal jogo MMORPGs que resumem as tarefas de jogo em quests.

    Agora, a crítica que faz a Metal Gear eu concordo. hehehe É aquela coisa também: o Kojima vem da área do cinema e, certamente, ele se preocupa muito mais com aquilo que vai mostrar ao jogador do que com o que o jogador vai poder fazer lá. E apoio totalmente sua colocação sobre manuais antigões. O próprio Ultima IV tinha um esquemão assim. No meio da introdução ele mandava você pegar o manual e ler. huahauhauahuahauha

    Eu tenho tais planos, como falei para ele mais acima. Quando for fazer isso, vou precisar de alguém para ilustrá-lo e tal. Além de uma editora; mas aí eu procuro depois, com mais calma.

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